sábado, 22 de fevereiro de 2014

6a. Lição: Currículo: Língua Portuguesa

Concepção, conteúdos e seus respectivos encaminhamentos metodológicos
“A investigação dos temas geradores ou da temática significativa do povo, tendo como objetivo fundamental a captação dos seus temas básicos, só a partir de cujo conhecimento é possível a organização do conteúdo programático para qualquer ação com ele, se instaura como ponto de partida do processo da ação, como síntese cultural.” (FREIRE, 2005. p. 209.)
DISCIPLINA DE LÍNGUA PORTUGUESA
Concepção do Ensino de Língua Portuguesa
Considerando-se as indicações das Diretrizes Curriculares Municipais da Educação de Jovens e Adultos que propõem o compromisso com a formação humana e com o acesso à cultura geral, bem como o respeito à diversidade cultural, à inclusão e ao perfil do educando, o estudo da linguagem na organização da proposta pedagógica do ensino de Língua Portuguesa está pautado na concepção sociointeracionista, a qual dá ênfase ao uso social dos diferentes gêneros textuais.
Nesse sentido, a escola está sendo entendida como um espaço onde se produz o conhecimento e tem por objetivo propiciar uma formação intelectual, cognitiva e política, por meio de pesquisas, leituras, estudos que favoreçam o respeito aos diferentes falares e aos saberes próprios da cultura do educando, preparando-o para produção de seu próprio texto, oral ou escrito, adequado às exigências dos diversos contextos sociais.
O trabalho pedagógico proposto para as práticas de linguagem está fundamentado nos pressupostos teóricos de alguns estudiosos que entendem a linguagem como interação.
VYGOTSKY (1989) dedicou-se a estudos sobre a origem cultural das funções superiores do ser humano, isto é, o funcionamento psicológico, a partir da interação social e da relação linguagem-pensamento. Por isso, propõe que se estudem as mudanças ocorridas no desenvolvimento mental, inserindo o indivíduo num determinado contexto cultural, a partir da interação com os membros de seu grupo e de suas práticas sociais. Para esse autor, a cultura é uma espécie de palco de negociações. Seus membros estão em movimentação constante de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e significados.
Nessa mesma direção, BAKHTIN (2003) afirma que os seres humanos apreendem a realidade e a constroem na medida em que se relacionam com o outro, atribuindo assim, sentido ao seu próprio viver, permeado pelo exercício efetivo da linguagem. Esse autor propõe o confronto dos diversos discursos a partir de temáticas do cotidiano, com ênfase na polifonia, dialogismo e polissemia. O primeiro constitui as diversas vozes do discurso oral e escrito; o segundo, consiste na interação do “eu” com o “outro”; por último, a polissemia, que compreende os diferentes significados da palavra, de acordo com a vivência sociocultural de cada sujeito.
As idéias de BAKHTIN e FREIRE (2004) convergem, no sentido de que a prática pedagógica deve se dar numa relação dialógica, entre os sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Para FREIRE, a relação pedagógica consiste no diálogo entre educador e educando, como sujeitos mediatizados pelo mundo. As propostas teóricas dos autores citados valorizam o processo interativo como espaço de construção dos sentidos do texto, confrontando situações a partir do contexto histórico, político, filosófico, social, entre outros.
Nessa perspectiva, GERALDI (2001, p. 41) identifica, historicamente, três concepções de linguagem: como expressão do pensamento, destacada nos estudos tradicionais; como instrumento de comunicação; como uma forma de interação humana.
A linguagem como interação propõe estudar as relações que se constituem entre os sujeitos no momento em que falam, e não simplesmente estabelecer classificações e dominar os tipos de sentenças. Portanto, o objeto de estudo da língua deve ser o texto oral e escrito produzido nas diversas situações de interação social.
A partir desses pressupostos, Val (1993, p.3) estabelece como propriedades do texto, a unidade sociocomunicativa – interação social e a unidade semântica – em que a coerência é o fator responsável pela unidade formal e material, ou seja, “pode-se definir texto ou discurso como ocorrência lingüística falada ou escrita, de qualquer extensão,dotada de unidade sociocomunicativa, semântica ou formal”. Essa autora afirma que, para o texto ser compreendido, precisa ser avaliado sob três aspectos: o pragmático, que se pontua em situação informal e comunicativa; o semântico, que depende da coerência; e o formal, que diz respeito à coesão.
Ainda de acordo com a autora, “a textualidade é o conjunto de características que fazem com que um texto seja um texto, e não apenas uma seqüência de frases” (VAL, 1993, p.5). Embasada em Beaugrande e Dressler, VAL relaciona sete fatores responsáveis pela textualidade de um discurso qualquer: coerência, coesão, intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, informatividade e intertextualidade.
Portanto, pode-se afirmar que o texto, em suas diferentes formas de apresentação ou gêneros, se constrói no aspecto sociocomunicativo por meio dos fatores pragmáticos funcionais, em constante interação entre os sujeitos.
Os gêneros, segundo BAKHTIN (1997, p.179), são caracterizados pelo conteúdo temático, pelo estilo e pela construção composicional, que numa esfera de utilização apresentam tipos relativamente estáveis de enunciados, tais como o conto, o relato, o texto de opinião, a entrevista, o artigo, o resumo, a receita, a conta de luz, os manuais, entre outros. A escolha do gênero depende do contexto imediato e, conseqüentemente, da finalidade a que se destina, dos destinatários e do conteúdo.
O trabalho com a diversidade de gêneros textuais possibilita o confronto de diferentes discursos sobre a mesma temática e ainda, permite uma metodologia “interdisciplinar com atenção especial para o funcionamento da língua e para as atividades culturais e sociais” (MARCUSCHI, 2005, p.18). Além disso, contribui para que o educando perceba a organização e os elementos de construção dos diferentes gêneros ou tipos textuais para que o educando possa reconhecer a finalidade, as características e produzir textos, seja do tipo narrativo, descritivo, argumentativo ou expositivo, entre outros.
A enunciação é dotada de tema e significação. O tema dá sentido na realização da enunciação, uma vez que ele é determinado não só pelas formas linguísticas, mas também pelos elementos não verbais da situação. Segundo Bakhtin (1986, p. 132) “ toda palavra usada na fala real possui não apenas tema e significação no sentido objetivo, de conteúdo, desses termos, mas também um acento de valor ou apreciativo, isto é, quando um conteúdo objetivo é expresso (dito ou escrito) pela fala viva, ele é sempre acompanhado por um acento apreciativo determinado. Sem acento apreciativo não há palavra”.
O tema e a significação indicam as particularidades de estilo e composição do enunciado, esclarecendo a que gênero pertence o texto, se é composto por um ou por diferentes tipos de discurso, considerando um acento de valor, ou seja, “convém discernir igualmente o grau de firmeza ideológica, o grau de autoritarismo e de dogmatismo que acompanha a apreensão do discurso” Bakhtin (1986, p.149). Nesse enfoque há que se considerar o contexto de produção e o conteúdo temático que o sujeito utiliza para produzir um texto, envolvendo os três mundos distintos, interiorizados por ele: o mundo físico, o mundo social e o mundo subjetivo, Assim, o contexto de produção ou a situação comunicativa exercem influências na forma como um texto se apresenta.
Ler um texto, nessa perspectiva, significa perceber o contexto histórico, social, econômico, filosófico e político em que ele se insere, assim como a ideologia, a finalidade do texto, a posição do autor e o possível interlocutor, dentre outros elementos tais como a escolha pela linguagem utilizada, os elementos gramaticais e seus efeitos na construção do texto nos diferentes gêneros textuais nos momentos de reflexão sobre a língua.
Encaminhamentos Metodológico
A concepção assumida em Língua Portuguesa pressupõe ações pedagógicas pautadas na construção do conhecimento de forma crítica, reflexiva, engajada na realidade, de modo a privilegiar a relação teoria-prática, na busca da apreensão das diferentes formas de apresentação do saber. Nesse sentido, a organização do planejamento pedagógico pressupõe a reflexão sobre a linguagem a partir de temáticas que exploram os diferentes gêneros discursivos e tipos de textos, com o objetivo de analisar as práticas de linguagem, ou seja, leitura, análise lingüística e produção textual.
A prática de leitura pressupõe a análise de diferentes linguagens, seja na forma verbal ou não verbal: iconográfica (imagens, desenhos, filmes, charges, outdoors, entre outros), cinética (sonora, olfativa, tátil, visual e gustativa) e alfabética, nos diferentes níveis.
Os diferentes níveis de leitura constituem-se num meio para identificar, nos diversos gêneros, os elementos de construção do texto, localizar as informações explícitas, subentender as implícitas, fazer ligação entre o conhecimento do educando e o texto, bem como estabelecer relações intertextuais.
Os gêneros textuais apresentados aos educandos precisam contemplar as possíveis situações de uso social da linguagem nas atividades propostas, tendo por objetivo identificar a finalidade do texto, a posição assumida pelo autor, o contexto social, político, histórico, econômico, filosófico, entre outros, com destaque para as variedades linguísticas, os mecanismos gramaticais e os lexicais na construção do texto.
Nesse contexto, salienta-se a importância de apreender os dados sobre o autor (biografia), a fonte referencial (data, local, suporte de texto), além do interlocutor a quem se destina o texto.
Os mecanismos gramaticais e lexicais não são estudados de forma descontextualizada ou com a intenção da apropriação da metalinguagem, mas a partir do texto para que o educando possa reconhecê-los como elementos de construção textual dos gêneros estilísticos e do cotidiano, uma vez que o objetivo do ensino da língua é orientar para o uso social da linguagem, de acordo com a norma padrão.
Para isso, faz-se necessária a prática orientada da produção oral e escrita de textos dos diferentes gêneros do discurso. O desenvolvimento dessa prática é importante porque o texto do educando revela, além do conhecimento de mundo, os conteúdos aprendidos e os que devem ser priorizados no planejamento do educador.
Para a seleção de conteúdos essenciais do Ensino Fundamental, bem como para as práticas de linguagem , foram utilizados os seguintes critérios: o perfil do educando da EJA; a diversidade cultural; a experiência social construída historicamente e os conteúdos significativos a partir de atividades que facilitem a integração entre os diferentes saberes. É importante destacar que embora os conteúdos sejam os mesmos para os dois níveis de ensino, o que difere é o grau de complexidade dos textos apresentados para a reflexão sobre a linguagem.
ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS ENSINO FUNDAMENTAL
Variedades linguísticas

- Norma culta, dialetos, gírias, regionalismos, outras formas de registros.
- Funções da linguagem.
- Linguagem verbal e não-verbal.
Gêneros textuais ou discursivos
- Elementos da construção dos diferentes gêneros discursivos e tipos de textos (informativo, instrucional, poético, narrativo, carta, bilhete, sinopse, etc.)
- Análise do discurso: linguagem, aspecto formal, finalidade, estilo, ideologia, posição do autor, ideologia, contexto histórico, social, econômico, político, entre outros.
- Elementos coesivos e coerência textual: unidade temática, elementos lógicodiscursivos, tese, organização dos parágrafos, contexto discursivo, interlocutor, idéia central, seqüência lógica, progressão, retomada dos elementos coesivos, título como elemento coesivo entre outros.
- Discurso direto e indireto.
- Recursos visuais, sonoros, olfativos, gráficos, etc.
- Relações referenciais: elipse, repetição, sinais de pontuação.
- Aspectos formais do texto: acentuação, pontuação, ortografia, paragrafação, título , legibilidade, aceitabilidade, entre outros.
- Ambigüidade como recurso de construção do texto.
- Ambigüidade como problema de construção do texto.
- Informações explícitas, implícitas e intertextualidade.
- Relações entre imagem e texto.
Elementos Gramaticais na construção do texto
- Pontuação e seus efeitos de sentido na construção do texto: vírgula, ponto-e-vírgula, ponto final, ponto de interrogação, exclamação, dois pontos, aspas, parênteses, travessão, reticências, entre outros.
- Emprego da crase na construção do texto.
- Classes de palavras: substantivo, adjetivo, verbo, preposição, conjunção, artigo, numeral, pronome, advérbio e interjeição na construção do texto.
- Sujeito e predicado na construção do texto.
- Vozes do verbo na construção do texto.
- Adjunto adnominal e complemento adnominal na construção do texto.
- Aposto e vocativo na construção do texto.
- Orações coordenadas, subordinadas, reduzidas e intercaladas na construção do texto.
- Concordância verbal e nominal na construção do texto.
- Colocação pronominal na construção do texto.
- Figuras de linguagem na construção do texto.
- Formação de palavras: prefixo, sufixo, radical, derivação e composição.

Nenhum comentário:

Postar um comentário